terça-feira, 8 de outubro de 2013

Festival do Rio – Parte 5



Halley (Idem, México, 2012)
Dir: Sebastian Hofmann


Curiosamente, esse foi um dos filmes que mais parece ter incomodado certo público do festival que foi abandonando a sessão a cada cena mais nojenta. E o filme nem é assim tão forte. Não é também uma proposta fácil e nem é dos que oferecem muita coisa ao espectador. Está mais preocupado em criar certa atmosfera. Faz isso muito bem, mas não se preocupa em dizer mais do que já apresenta. É como um filme exibido, que te prende a atenção, mas deixa uma sensação de vazio ao final.

É uma proposta a ser aderir. Muita gente pode não se afeiçoar ao ritmo moroso da narrativa, mas acima de tudo existe uma coesão muito interessante aqui, via proposta surreal em que um homem passa a subexistir como um morto-vivo. Seu corpo deteriora-se na nossa frente, mas ele continua vivo. Arrasta-se, sempre cansado, despedaçando-se literalmente, mas vivo.

O filme se esforça bastante para traduzir o estado sensorial desse indivíduo em estado peculiar, desfocando a imagem, embaralhando os sons ambientes, com se tentasse colocar o espectador nesse lugar tão estranho. Mas há também muito de humor negro que se tira daí (uma longa sequência no necrotério é impagável), meio por não sabermos muito como lidar com aquela situação e com os desdobramentos que ele acaba tendo nessa condição de desfacelamento físico. É portanto um filme que inquieta e isso já é muito positivo em termos de impressão.

O problema maior talvez seja o fato de que, para além de construir esse clima mórbido-cômico, o filme não consegue ir além de criar cenas e mais cenas engraçadas e escatológicas. Entendemos já no início a condição e o próprio universo não-realista em que o personagem se encontra, mas não existe um comentário a mais sobre sua condição, sobre seu estado de solidão, o descaso de todos ao seu redor.


Gare du Nord (Idem, França, 2013)
Dir: Claire Simon 


Depois de ter conferido um documentário anterior da diretora Claire Simon, Custe o que Custar, fica clara aqui a experiência e o olhar aguçado da realizadora francesa para observar o real e as pessoas circulando no espaço. Pois tem muito disso aqui nesse Gare du Nord, embora a impressão geral é de um filme já visto antes.

É tudo muito bem cuidado em termos de direção e texto, com personagens plausíveis carregando seus conflitos pessoais. Mas para além da ideia de reunir anônimos num lugar de tanta gente, o filme é mais um retrato de corações solitários que se encontram e desencontram nesse grande espaço de circulação que é a maior estação de trem da França.

Há ali um universo de vidas que se cruzam a todo instante, da qual a diretora pinça algumas delas para compor seu quadro de dramas. Mathilde (Nicole Garcia) é uma mulher de meia idade solitária que conhece e se apaixona pelo jovem estudante (Reda Kateb). Eles vão conhecer também Sacha (François Damiens), à procura por sua filha desaparecida que fugiu de casa, e Joan (Monia Chokri), uma mulher dividida entre o trabalho e a família, indo constantemente de Paris a Londres.

Apesar da sensibilidade na abordagem, o filme é morno ao dar consistência ao todo porque não há muito o que retirar dali para além do reprocessar dos dramas pessoais que cada um enfrenta, cercado por uma atmosfera de melancolia. Soa até mesmo enfadonho muitas vezes, apesar das ótimas intenções.


Heli (Idem, México/França/Alemanha/Holanda, 2013)
Dir: Amat Escalante 


Amat Escalante continua sua jornada para de retratar um certo mundo cão no México, especialmente ligado à violência e ao narcotráfico que impera em muitas regiões do país. Como em seus trabalhos anteriores, Sangre e Los Bastardos, sua estética naturalista, quase impassível diante da desgraça que filma, está a serviço de histórias brutais, sem concessões. Mas a grande diferença em relação a esse seu novo filme, e que faz Heli estar bem à frente, é que aqui existe uma boa história para contar. 

Se nos trabalhos anteriores o diretor estava muito mais preocupado na forma e dizia muito pouco como conteúdo, geralmente trazendo personagens pelos quais era difícil ter consideração, em Heli ele consegue de cara nos afeiçoar por Estela (Andrea Vergara), essa garota colegial que se apaixona por Beto (Juan Eduardo Palacios), jovem inconsequente envolvido no contrabando de drogas. Ele vai acabar escondendo mercadorias clandestinas na casa da garota, o que traz problemas para sua família, em especial seu irmão Heli (Armando Espitia).

Mas não seria um autêntico Escalante se já não começasse com uma cena de assassinato brutal. O filme vai retomar essa sequência depois, encaixada na história, à medida que vamos entendendo aos poucos, e sem meios explicativos, o pequeno quebra-cabeças que envolve os conflitos dos personagens. 

É muito interessante quando um diretor consegue construir esse universo que lhe parece tão caro e o caracteriza, mas vai evoluindo sua linguagem e lapidando melhor sua narrativa. Heli apresenta essa melhora e parece que estamos no mesmo terreno arenoso já visto antes, inclusive através do mesmo tom de fotografia e ritmo de tempo. É também a história de como a vida bandida e os perigos do narcotráfico invadem a vida dos de bem, destruindo famílias e passando por cima da dignidade.
 

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