quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Mostra de Tiradentes – Parte II



O Animal Sonhado
(Idem, Brasil, 2015) 
Dir: Breno Baptista, Luciana Vieira, Rodrigo Fernandes, Samuel Brasileiro, Ticiana Augusto Lima e Victor Costa Lopes



Um coletivo de jovens realizadores trouxe para o festival de Tiradentes o primeiro filme da competição na Mostra Aurora. O Animal Sonhado é um esforço conjunto de jovens que estão concluindo ou acabaram de terminar o curso de cinema no Ceará. Impressionam mesmo pela maturidade com que exploram um tema tão subversivo.

O filme possui alto teor erótico e acompanha pequenas histórias de jovens que lidam com a pulsão sexual e os desejos do inconsciente. Trata-se um filme-mosaico, formado por vários episódios, mas muito coesos entre si. A própria maneira muito fluida com que passamos de uma história a outra já revela a unidade do filme.

A coerência narrativa encontra-se tanto na temática, quanto na estrutura formal, o que revela uma sintonia muito grande entre seus realizadores: Breno Baptista, Luciana Vieira, Rodrigo Fernandes, Samuel Brasileiro, Ticiana Augusto Lima e Victor Costa Lopes. É importante citar cada um deles porque, sendo muito jovens, alimenta uma curiosidade de vê-los seguindo adiante, já que todos filmam sexo muito bem, artigo cada vez mais difícil no cinema recente.

O sexo aqui é visto ausente de moralismos e também sem fetichismos baratos. Trata-se um retrato muito cru das relações entre jovens quando o tesão fala mais alto. Um filme altamente provocador, mas nunca gratuito, ainda que algumas histórias não passem de uma situação pontual (os amigos mais que amigos do início, o pai tarado), enquanto outras investem pesado na introspecção (a garota mais gordinha) e no subconsciente (o bacanal que fecha o filme). 

Todas as histórias exploram muito apropriadamente os corpos dos seus atores e também as taras que muitas vezes permanecem encerradas nos pensamentos. Em muitos momentos é possível questionar o que está acontecendo de fato e o que é fruto da imaginação deles. É talvez essa marca dos desejos reprimidos e inconfessáveis (somos, nós, espectadores, os privilegiados então) que faz unir tão bem esses contos que exploram a tensão do tesão.


Teobaldo Morto, Romeu Exilado (Idem, Brasil, 2015) 
Dir: Rodrigo de Oliveira

O segundo dia da mostra competitiva em Tiradentes trouxe um filme mais desafiador. Teobaldo Morto, Romeu Exilado, do capixaba Rodrigo de Oliveira, é um conto solene e introspectivo sobre dois homens que se confrontam em situação inusitada. Tem lá seus preciosismos de encenação (talvez muito disso), mas é possível colher ali bons momentos.

O filme começa com algo de muito afetuoso na maneira como João (Alexandre Cioletti) deixa a mãe e a esposa grávida para partir numa espécie de retiro numa fazenda. Lá ele tem a inesperada visita de Max (Rômulo Braga), um antigo amigo dado como morto, o que reacende traumas e feridas do passado.

A história logo assume um tom mais duro, com algo também de onírico (e posteriormente mitológico), além de marcar desde o início um tom muito não-naturalista. Tudo acentua o desconforto que aquele encontro gera, à medida que vamos entendendo os embates que existem entre eles, fazendo aflorar as mágoas e obrigando o acerto de contas.

É certamente um trabalho que exige do espectador um tipo de entrega que o filme pouco retribui. As duas horas de duração podem cansar até mesmo os mais exigentes e a impressão é de um diretor que não consegue enxugar sua narrativa, deixando-a inchada, em prol de um tom misterioso e nunca óbvio que a história assume. Existe um apego nítido por uma plasticidade que corre o risco de soar gratuita muitas vezes.

Mas não deixa de ser uma evolução no cinema que Rodrigo de Oliveira faz. Seu filme anterior, Horas Vulgares, é bem mais pretensioso esteticamente, verborrágico e pouco acessível. Afasta mais do que gera interesse. Aqui nesse novo projeto o diretor se mostra muito mais seguro das opções estéticas de que lança mão, só precisava de um pouco de freio. 

O plano longo, com poucos e lentos movimentos de câmera, o apreço pelo tempo morto, tudo é muito melhor trabalhado aqui, o que demonstra um cineasta que domina o tipo de linguagem que prefere utilizar para compor um certo estilo. O filme tem momentos de muita força estética e dramática (a entrada em cena de Max, a briga entre os dois em campo aberto, o inesperado "entendimento" que surge entre eles da forma mais íntima possível), mas teria maior impacto se exercitasse melhor a síntese.

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