sábado, 14 de fevereiro de 2015

Mostra Tiradentes – Parte VI


Ela Volta na Quinta (Idem, Brasil, 2014)
Dir: André Novais Oliveira

Pode parecer muito precoce atribuir ao cineasta mineiro André Novais Oliveira um projeto de cinema tão sólido, ou mesmo uma marca autoral presente em sua curta trajetória como diretor, apesar dos marcantes trabalhos em dois curtas e agora no seu primeiro longa-metragem, Ela Volta na Quinta, que encerrou a Mostra de Tiradentes.

A novidade aqui é que André abusa do íntimo e do autobiográfico para criar uma narrativa ficcional carregada de um naturalismo irretocável. O curta Pouco Mais de um Mês já antecipava esse tipo de fazer em que o próprio André encenava com sua namorada Élida as primeiras investidas de um namoro. Na vida real e na ficção, essas histórias e personagens se complementam, com uma delicadeza prosaica que torna tudo tão encantador.

Agora, com Ela Volta na Quinta, o cineasta dá mais um passo nessa construção narrativa tão peculiar. Utiliza as personas de sua própria família para encenar o fim do casamento do pai e da mãe, vividos pelos próprios progenitores do diretor. Este, por sua vez, retorna à cena com Élida (numa espécie de prosseguimento do curta anterior), mais o irmão e sua namorada.

Todos emprestam suas figuras particulares para a narrativa que segue seus próprios caminhos. E todos parecem muito confortáveis aqui, entendendo bem o fio narrativo que se tece no filme, como se aquilo fosse a extensão de suas vidas. Os personagens comportam-se e conversam com a maior naturalidade possível, e o filme chega a tocar na banalidade que há no nosso dia a dia (a cena do irmão mostrando o vídeo no youtube é exemplar nesse sentido – e engraçadíssima também).

O filme segue um ritmo todo particular, sem pressa, investe nas ações mais cotidianas de pessoas comuns. Dá a impressão mesmo de que estamos invadindo a casa do vizinho da rua de trás, adentrando sua intimidade e conhecendo os conflitos que se desenham ali. Aos poucos vamos nos dando conta de que o distanciamento de D. Maria José e de seu Norberto é inevitável, apesar do carinho e cuidado que ainda existe ali.

É notório que o caminho perseguido por André lança um outro olhar para as relações interpessoais atravessadas pelo íntimo, pelo cotidiano de uma classe média do subúrbio mineiro. Tudo isso coberto por uma doçura sem igual, vide a cena do casal dançando Roberto Carlos na sala, desde já memorável. 

Ainda assim, o filme pode ser visto não só como um retrato melancólico do fim de um relacionamento duradouro. Num outro polo, ambos os filhos planejam com suas companheiras a compra de um apartamento ou a chegada de um filho. Ou seja, querem formar uma família, solidificar uma vida juntos. Assim, Ela Volta na Quinta resgata, da maneira mais singela e desproposital possível, o ciclo da existência humana: nada é infinito, as relações acabam e outras começam, a roda da vida não para.

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